Vanessa 2, moral e legislação
É imoral forçar uma miúda, uma alcoólica, uma mãe desgastada e pobre já com cinco filhos, uma mulher em tresvario seja por que for, e todas outras situações de vida mais ou menos graves, a seguir até ao fim com uma gravidez.
É imoral interromper o processo biológico de gestação.
Afinal, como é que a lei, que convém ter um termo que possibilite práticas e resultados (há dúvidas acerca disto relativamente ao nosso glorioso Portugal, mas siga) pode resolver este imbróglio?
14 Comments:
Estás confundido/a.
Moralidade tem a ver com responsabilidades, mas também com possibilidades.
No primeiro caso, há alternativas moralmente aceitáveis: garantir apoio à mãe, facilitar a dopção, etc...
No segundo caso, interrompida a gestação, não há alternativas. Há uma intervenção imoral irremediável.
Parecem-me situações diferentes.
Eu acrescentaria, quanto à lei, algo que é de senso-comum mas precisa de ser dito: a lei é formulada no abstrato (no sentido em que se baseia em princípios [forçosamente éticos]) e aplicada no concreto. Significa isto que, da proibição até à condenação vai um mar de considerações de variadíssima ordem. Caso contrário, um computador seria um bom juiz.
Um Feliz e Santo Natal e um Ano de 2007, Repleto de Bênçãos do Céu e das Graças do Deus Menino.
Deus é Amor.
Os Discípulos
Bom dia Manuel(a).
Qual primeiro caso? Há muitas situações, psíquicas, físicas, sociais e etc que já são irremediáveis.
Para além disso, não é aqui que vão garantir apoio (qual apoio, a gravidez prossegue, não pára e fica à espera do problema biológico, psíquico, social, ser resolvido), facilitar a adopção e etc. E uma lei tem de integrar-se no corpus legal em que se integra, assim como na realidade em que se vai aplicar, ou então não será realmente aplicada. Estamos a falar do quê? De utopias?
Se queres mudar o sistema pelo seu todo, isso é outra conversa. Mas então não falemos de leis.
Eu sei que estou em experimentação limite, e que as implicações destas interrogações têm horizonte terríveis e assustadores. Mas a realidade é o que é. E desbastar os limites ajuda a olhar – pelo menos a mim.
A questão reside no perigo que é determinar-se qual a instância a partir da qual se decide e define a irremediabilidade e suas consequências. Se for o Estado, estamos-lhe a dar um poder imenso, que pode ir, mau grado o meu disparo, à questão acerca do nazismo que o David referiu. Se for por vontade da mulher… e esta é a interpelação dos que vão votar sim.
Acredita: também eu estou muito confundido/a com o assunto. Preferia infinitas vezes que o problema nem se pusesse, e as crianças nascessem no esplendor e mistério da vida e dos dias.
Repito: considero o aborto um irremediável mal, que só o perdão interior e a penitência transfiguradora pode resolver pessoalmente (ou outra coisa qualquer no profundo da consciência, para um não-cristão).
Estamos a falar de matar seres vivos, e humanos, numa fase qualquer da sua vida. Estamos a falar de gravidezes e nascimentos a ocorrer ou não ocorrer em estropianço total.
Eu sei disso.
Mas as questões têm de ser enfrentadas de frente. Todos os seus pontos e perspectivas. Não tivesse este assunto as implicações que tem.
Não aceito que me digam: é simples, e argumentem abstractamente. A vida não é um conceito. É uma carne que se distende na temporalidade, na mulher e no feto, para o caso.
Há muita, muita, muita dor… Gostaria que todos nós, seja qual for o nosso voto ou não voto, pensentissemos que nenhuma das soluções é imaculada… E não falo de dizer tal, porque isso quase todos nós o dizemos… Tranquilamente, até… E falo por mim…
Caro Rui Fernandes.
Não me refiro a condenação nenhuma, mas ao pressuposto de que a gravidez deve moralmente ser levada até ao fim contra a vontade e consciência da mulher.
Um abraço.
Feliz Natal, discípulos.
(Re)nascer, claro.
Que o amor esteja convosco.
Caro Vítor,
É antes da gravidez que se joga a liberdade, ou não? Se não, onde está a responsabilidade na liberdade? Ou será que uma faz sentido sem a outra?
A lei, que é do que se trata no referendo, baseia-se em princípios de ordem ética; e um deles, é o da necessidade de protecção da vida humana. Suponho que o Vítor o considere, como eu, inabalável.
Abraço.
Sim Vitor,
Há muita coisa.
SE queres ir por aí, vai. Mas sabes tão bem como eu que, nesse caso, nunca sairás em lado nenhum. Se te queres perder em novelos argumentativos, tudo bem. Mas estás a aportar mais confusão que outra coisa...
Huuuum… perder-se em devaneios, derivar por aí, novelos argumentativos, confusão… Até parece a vida :P
Outra coisa.
Vou tentar exprimir isto.
É qualquer coisa como estar em tensão: a luz e a sombra, o eu e os outros e o resto, o que se sabe e o que não se sabe, o mal e a vítima, e mais fundo, o pecado e a graça.
E não, não é simples. E eu sou lento. Involuntária, mas também voluntariamente.
Como que havendo um momento indagatório, de tentativa de constatação do que se passa. Sim, claro, é sempre muita coisa. Infinda, há-que chegar a um ponto e devidir algo, uma posição, uma atitude, um acto. Quando chegado o momento certo para nós, é o que tentamos discernir e fazer, penso eu.
Acho que o que se passa também é que não me sinto pressionado para votar em Fevereiro acerca da legislação… Ou talvez porque seja lento mesmo muito lento, ainda me falta ver o que fazer perante o governo democrático-liberal que tenta reger-nos, e antes disso a ética e os costumes também pouco resolvi disso. E coisas mais fundas, o bem e a beleza, e o amor nisso tudo e em mim.
Cada qual traz a sua voz, não sei. Qual é afinal o problema da confusão? Para ti é evidente: perante a pergunta do referendo, vota-se não. Óptimo. Ou não, sei lá. Mas comigo não é assim de todo. Há problema em indagar pontos e contrapontos? Pois, estou a ver.
Trago aquilo onde estou e sou. Não sei fazê-lo de outra forma.
Verdade seja dita também que nem ligo muito à ideia de debate esclarecedor. Para mim, é sempre mais uma tentativa de escuta do outro. Não estou muito interessado em que pensem como eu (ou votem como eu :P) ou coisas do género. O que não significa que a afinidade, electiva ou surpreendente não me toque, é evidente que sim. Mas deixo-a fulgir ou sombrear na abertura da alteridade. Ou melhor, faço muito pouco de tal, suponho, mas não deixa de ser esse o horizonte.
We need more time, and less history, disse alguém. Algo do género. Chegar a algum lado, não chegar, nunca chegar a lado nenhum. Sim e não, assado e cozido, preto e branco com aparente suspensão de juízo para o cinzento. E está tudo resolvido. Mas eu estou preocupado com o grito do gato, não com a sua classificação. E os gatos só são todos pardos para aqueles cujos olhos não estão habituados à noite.
Mas como preferes tu? Simplificado? O que queres simplificar? Como não tem pena efectiva, mantém-se a sociedade simbolicamente vigilante no princípio de vida?
Ok.
Mas isso não é nada simples para alguns :P
Abraço, bom fim de semana.
Caro Rui Fernandes, bom dia.
A liberdade, ou se preferir a possibilidade de escolha mais ou menos iludida, joga-se quase sempre, nem que seja interiormente – tecnicamente, é sempre possível resistir a algo. A aferição de se se decidiu mais ou menos livremente, a que corresponde a pergunta: Quem responde pelo acto? é algo que me soa muito delicado. Não me parece poder decidir-se sempre formalmente (género se um carro bate por trás é sempre culpado ;) É evidente que bater é sempre um mal, mas condenar “o acto em si” não me parece trazer muito para aferição legislativa, mas mais para perspegar representações na bandeira da identidade nacional (para o caso) ou ideológica. Eu tenho imensas dúvidas nesta matéria, assim como umas questões relativamente à inabalabilidade da vida individual, mas agora não estou com muito tempo. Há umas que não estão resolvidas de todo, mas talvez consiga a suficiente clareza para expô-las enquanto dificuldades minhas na resposta que darei do seu mais longo e especificado comentário da minha Nota 3, sejamos claros (sic;) a que tentarei dar reacção hoje ou no fim de semana, que lhe desejo bom comente eu quando comentar ;)
Abraço.
Penso que o Post do CA resolve brilhantemente esse dilema.
Vítor,
Então a liberdade dum humano não termina onde começa a de outro humano?
A liberdade, como a maioria dos valores, é um termo formal cujo significado depende do seu conteúdo e contexto: liberdade do quê, para quê, relativamente a quê… Mas penso que é melhor esperarmos pela minha reacção ao seu comentário já referido, porque isto de trocar frases como galhardetes sem um enquadramento mais geral no discurso de cada qual, é menos comunicante e com mais possibilidades de equívocos no emprego dos termos. E já que vou dizer algo perante o seu comentário e que este tem já um enquadramento com alguma elucidação…
Mãe alcoólica?
Suponho que irá continuar a beber muito durante a gravidez.
Não sei se a criança, depois de nascida, ficaria na lista dos preferidos para serem adoptados.
E, já agora, não me parece sequer justo que se "obrigue" quem quer adoptar um bebé porque não os pode ter (não estou a falar da adopção altruísta muito em voga entre a estrelas de Hollywood) a ficar com os desgraçadinhos da sociedade, esses filhos de mães alcoólicas, drogadas, com sida e com hepatite. Essas que não foram a consultas de obstetrícia, nem tiveram quaisquer cuidados durante a gestação (não tomaram ferro nem ácido fólico nem fizeram outra dieta que não fosse a de álcool e heroína).
É tão bonito dizer que se adopta e que o caso fica resolvido...
Aliás, não há putos na Casa Pia e nas oficinas de São José? Não há putos sem-abrigo? Não há pois não? Foram todos adoptados por gente de bem.
Relembro que actualmente o aborto é proibido em Portugal e se as coisas funcionassem não havia abortos ilegais (porque era tudo resolvido pelas associações de apoio às Mães), nem putos nos orfanatos (porque eram todos adoptados).
Parece que as pessoas que defendem o Não se esquecem que agora é o Não que "manda" e o estado das coisas é o que se vê.
Os do Não não são, propriamente, "um partido que nunca esteve no poder" para virem falar de coisas tão bonitas como se as conseguissem por em prática só que ainda nunca ninguém os deixou...
Agora vivemos sob a alçada do Não, porque é que falam como se fosse depois deste referendo que vocês vão entrar em acção? Porque é que não respondem pelo que andaram e não andaram a fazer e se deixam de falar nas coisas como se não tivessem nada a ver com elas?
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